sexta-feira, 17 de julho de 2009

Adeus leve leve

E assim chegaram ao fim 4 meses de leve leve...

Domingo estou de volta a Lancaster!

Terras de cacau

São Tomé já foi, no início do século XX, o principal produtor mundial de cacau. Desde então a produção tem vindo a decair e actualmente muitas das antigas roças do cacau estão abandonadas. No entanto uma proporção significativa da ilha continua coberta por plantações de cacau, em diferentes estados de degradação, e sobre diferentes formas de gestão: pequenos produtores, associados ou isolados, médias e grandes empresas, sobre gestão privada ou como propriedade do Estado.
Costa Santos – Uma das muitas roças que foram sendo abandonadas, em especial depois da independência, e que estão a ser rapidamente engolidas pela floresta! Para dar uma ideia o único edifício que resta nesta roça é uma pequena igreja de pedra construída em 1956, e muito provavelmente, tal como tantas outras, há 35 anos ainda funcionava.
Estrada de mato (antiga linha férrea) – Uma das razões para o abandono das plantações é a degradação dos acessos. Outrora coberto por uma rede ferroviária de mais de 600km, não restam hoje senão uns fantasmas desse meio de transporte, e mesmo o acesso rodoviário é em muitos casos apenas possível de tractor. O meu pobre Feroza, por exemplo não conseguiu chegar à parte do caminho na foto!

Apesar da decadência das plantações, o cacau continua a ser uma das principais exportações de São Tomé e Príncipe, em grande parte devido à decadência económica generalizada do país. Mesmo a quilómetros da estrada transitável mais próxima, muito do cacauzal continua a ser explorado. Sobretudo quando é pertença de pequenos agricultores que não têm muitas alternativas de rendimento, mas o envelhecimento das plantas e as dificuldades em fazer os tratamentos fitossanitários, acaba em muitos casos por levar a um abandono progressivo deste tipo de exploração.
Cacaoeiros podados

As variedades de cacaoeiro cultivadas em São Tomé, têm que ser protegidas da exposição directa ao sol, por árvores de grande porte. Este habitat criado pelo Homem, apesar de não ser utilizado por todas as espécies florestais nativas da ilha, parece ser utilizado por muitas delas. Pensa-se que uma das razões seja o facto de a estrutura da vegetação se assemelhar mais à floresta do que em outras práticas agrícolas. A existência de recursos mais diversificados neste tipo de plantações também contribui certamente para a sua diversidade e quando a sombra é utilizada para outras culturas (como a bananeira e a matabala na foto) o número de espécies aumenta efectivamente.
Plantação de sombra

Mas depois de tanta conversa sobre cacau, fica por saber por que raio é tão difícil arranjar chocolate nesta ilha... E fica desde jáo aviso que o P.E.P.O.T.E. (Plano de Engorda Para O Trinca Espinhas) vai voltar à acção e desta vez vai-se basear em chocolate. Coisa que, paradoxalmente vai ser facílima de encontrar em Lancaster... Como diria o Homer Simpson, babando-se: “Chocolate...”

quarta-feira, 15 de julho de 2009

Madeira downhill

Os madeireiros de São Tomé não têm uma profissão nada fácil. A maioria da boa madeira está em zonas com muito maus acessos e em terrenos com muitas inclinação, onde muitas vezes só é possível trabalhar durante a gravana. É muito bom para a preservação das florestas, mas vejam só a trabalheira que dá arrancar umas tábuas por estas bandas:
- Escolher uma árvore de boa madeira e grandes dimensões;
- Acartar uma motosserra encosta acima, muitas vezes abrindo ou melhorando caminhos;
- Deitar a árvore abaixo;

(Nesta fase do processo, nas zonas mais inclinadas, isto significa que a árvore não só vao cair no chão como também se vai arrastar pelo chão da floresta, e tudo o que apanhar pela frente, até chegar a terreno mais plano. Basicamente a árvore provoca uma derrocada e chega lá abaixo já partida)
- Cortar a árvore em tábuas ou barrotes;


(Apenas as partes mais valiosas da madeira são aproveitadas, porque o transporte é muito difícil, tudo o resto fica na floresta a apodreder. É um processo muito pouco eficiente. Imagine-se só o que não deve ser cortar uma árvore gigante a motosserra!)
- Acartar as tábuas e barrotes até ao caminho mais próximo, o que em muitos casos pode significar muitos quilómetros de voassatá e caminhos em péssimas condições.

(Algumas vezes os barrotes e tábuas ficam a apodrecer na floresta, porque o transporte do material nunca chegou...)

(Imaginem a ginástica precisa para descer este caminho, com um monte de tábuas à cabeça...)

Morro Muquinqui

E uma das coisas boas do trabalho de campo é que nos leva a sítios que de outra forma não nos passaria pela cabeça. Foi assim que dei com o Morro Muquinqui. Tem umas vistas fabulosas sobre a parte Norte da ilha e tem caminho acessível até ao topo. Não percebo como ainda ninguém descobriu o potencial turístico deste sítio, mesmo ao lado da cidade de Gaudalupe e de uma série de praias “turísticas”...

Plantação de cana de açúcar em quantidade, para que não falte a bela da cacharamba (aguardente de cana).



O ilhéu das Cabras, com uma queimada na zona de Fernão Dias.



Uma vista espetacular sobre a Roça Agostinho Neto, provavelmente a mais conhecida do país!

Gravana ao rubro

E finalmente temos gravana a sério...

Nebulado, vento forte junto ao mar, pouquíssima chuva e frio, MUITO FRRRIO. OK, muito frio é um exagero, mas para os padrões locais é bem verdade. Devem estar uns 15°C na zona de Monte Café, e atendendo às casas e roupas que por aqui existem, dá efectivamente para ter frio! Eu por exemplo estou a dormir de pijama e meias, com lençóis, manta, colcha e saco-cama! Mas não tenho vidro na janela. O vidro é um luxo a que poucos se podem dar!

E apesar deste frio todo, como esta é também a época mais seca e, ao bom espírito deixado pelos portugueses, é a altura ideal para pegar fogo à floresta. Uma coisa difícil de imaginar noutras épocas do ano..

Primeiro cortam-se as ervas, arbustos e árvores mais pequenas.


Quando estiverem secas, pega-se fogo.

E depois é cortar as madeiras que restam e plantar tudo e mais umas botas, para ver o que pega!
Esta época do ano é sem grandes dúvidas quando a floresta está mais ameaçada e não só pelas queimadas associadas ao avanço agrícola, mas também porque todas as outras actividades são particularmente intensas nesta época do ano: abate de árvores, caça, manutenção de caminhos, ...


Búzio-vermelho – Trata-se de uma espécie introduzida recentemente na ilha, mas que se tem espalhado como fogo. E até é bom que os vão apanhando, para controlar a expansão deste bicharoco. As quantidades que apanham são gigantescas...

segunda-feira, 6 de julho de 2009

Uma semana pelo Sul!

A semana passada foi passada a acampar pelo distrito de Caué, no Sudeste de São Tomé!
Grande parte desse tempo foi passado na zona de Ribeira Peixe, onde existe a EMOLVE (Empresa de Óleos Vegetais), uma grande plantação semi-abandonada de palmeira-de-andim para produção de óleo de palma! Esta monocultura representa uma enorme ameaça para a biodiversidade da ilha, sobretudo se avançarem os planos de reabilitação e expansão, dos actuais 610ha para cerca de 2000ha!
A plantação de palmeira-de-andim domina na zona de Ribeira Peixe!


Pico Cão Grande – Esta espectacular agulha vulcânica emerge 400m acima da área circundante!

No entanto, e apesar desta séria ameaça aos valores naturais, é também por aqui que existem algumas das áreas florestais de baixa altitude mais bem preservadas da ilha, onde se podem ver algumas das espécies de aves mais ameaçadas do mundo: a galinhola, o enjoló e o picanço!
Um aspecto da floresta de baixa altitude nos arredores de Ribeira Peixe!
Obo - Vista de um caminho dentro da floresta primaria
Para além da ameaça da destruição directa do habitat para converter em zona de plantação, outras ameaças pairam sobre a floresta nesta região, nomeadamente a caça e as espécies introduzidas (cobra-preta, porco, lagaia, doninha, macaco, búzio-vermelho, quina, bambú, palmeira,...).

Mucanha – Esta ave, endémica de São Tomé ao nível subespecífico, é muito frequente nesta região e parece ser bastante caçada. Curiosamente noutras zonas da ilha, esta espécie não é caçada porque se alimenta no chão...

Cobra-preta – Uma espécie introduzida para caçar roedores nas plantações de cacau, mas que actualmente se encontra espalhada por toda a ilha e que provavelmente faz sérios estragos nas populações de espécies animais nativas!

Estes dias passados no campo teriam certamente sido muito mais duros se não fosse a colaboração do tempo, nublado mas praticamente seco, e das pessoas que nos acolheram de uma forma espetacular por onde quer que fossemos passando!

Missi e Mitu – Tecto, comida e orientações, nada nos faltou durante a nossa estadia na EMOLVE!

Crianças do quintal da EMOLVE – Depois de um raspanete por causa do “branco, doce”, lá aprenderam a chamar-me pelo nome e no último dia até tive direito a serenata depois de chegar do mato! Em troca não levaram doce, mas tiveram uma extra prolongada sessão fotográfica!

Aleluia, aleluia!

Para além do objectivo principal da minha estadia em São Tomé, fui acumulando uma série de missões paralelas. A bicharada destas bandas suscita mesmo muito interesse entre os cientistas e, estando por aqui, podia ir entretendo-me a recolher umas amostrazitas! Um destes pedidos era para apanhar uma doninha, localmente conhecida por rato-aleluia, cauiri ou rato-xixi.
E depois de contactar algumas pessoas, a mensagem parece ter-se espalhado e finalmente consegui deitar as mãos a um destes animais. Graças a um grupo de rapazes da Monte Café que cometeu a proeza de o apanhar com um casaco! O animal ainda esteve vivo por algum tempo, mas quando me vieram entregar já estava morto.
Se conseguir levar o animal para Portugal, talvez se consiga finalmente esclarecer a origem destes animais, introduzidos na ilha pelos portugueses para controlar as populações de roedores, e perceber se estes animais são efectivamente gigantes dentro da espécie!


A doninha e um dos seus captores!