quinta-feira, 28 de maio de 2009

Bicharada sem sair de casa (ou as vicissitudes da vida no campo)

E a acrescentar à lista das maravilhosas criaturas que pululam pela Nova Moka.

Ratazana – Carinhosamente chamado de rato pelos locais. Aqui fica o registo do exemplar morto pela Bica (a cadela cá do quintal). Obrigado Bica, menos uma ratazana mal-cheirosa a correr por cima da minha cabeça enquanto estou a tentar adormecer, e a roubar as bananas que com tanto esforço consigo apanhar no quintal e pôr a amadurecer!


Panaspis sp. – Mais uma espécie nova para a Ciência e que só existe em São Tomé. Existe um estudo de genética recente que indica que esta espécie é diferente das até agora descritas. Com um pouco de sorte este espécime que apanhámos cá pelo quintal vai ser usado na descrição da espécie ainda sem nome.

Há ainda a acrescentar uma simpática escolopendra que misteriosamente apareceu na minha cama, enquanto estava a trabalhar ao computador. Não existem registos fotográficos porque apressadamente me empenhei em escorraçar a criatura do quarto e desfazê-la em pedaços. Nem deu tempo para pensar em fotografia... Menos mal que havia electricidade e não estava a dormir: diz-se que uma picadela desse bichinho dá direito a ficar de cama a contorcer em dores e com inchaços brutais!

Vem depressa gravana

Depois das chuvadas destes últimos dias começo a duvidar que exista uma época seca nesta terra!!!
Mais um monumental desabamento de chuva na Nova Moka, desta vez com direito a cair chuva em cima da minha camita e tudo...

Não é de brincadeira

Finalmente tive a minha primeira experiência a acampar em São Tomé. Quatro dias a andar pelos confins do Noroeste da ilha em busca de floresta. Inicialmente andava à procura de floresta pouca alterada pelo Homem, mas no fim já servia qualquer floresta, desde que tivesse um quilómetro que desse para fazer mais ou menos em linha recta. Felizmente a parte mais seca da ilha vez justiça à fama e quase não choveu! E mesmo assim não foi nada fácil...

Estradas que não deviam merecer o nome de estradas. Ainda por cima eu teimo em acreditar quando me dizem que “se tem tracção, passa!” Pois NÃO PASSA!!! A minha ferazita não atravessa rios de calhaus, nem rampas de lama e eu prefiro ir a pé, quando um dos lados da estrada dá para uma falésia sem fim à vista. O limited da Fera fica mais ou menos por isto:

Uma ponte de tábua podre revestida a casca de caracóis gigantes, seguida de uma estrada com calhau rolado (também ele gigante), seguida de lamaçal com um palmo de altura. Mais 100m e ficou-se pela rampa enlameada na curva. Muito obrigado, mas não passa, não, nem “traçado”. Se soubesse que era assim tinha ido a pé...

Depois de largar o carro começa a parte que dói a sério. Geralmente começa com uma caminhada de uma boa meia dúzia de quilómetros, seguida de uma escalada de tirar o fôlego. Depois são horas e horas a andar na floresta para a frente e para trás à procura de um sítio que dê para trabalhar. E facilitadores de percurso não faltam: são as lianas a prender os pés, as folhas e troncos que coçam, picam ou cortam, o chão que ora é de pedra solta ora é de lama (muiiiito) escorregadia e a inclinação, quase sempre acima dos 45%. E isto é sem contar com a fauna: cobra-preta (mordedura fatal), escolopendra (venenosa), sumangongô (tarântula gigante), formiga aliança (que desconfio deve ter inspirado o episódio do MacGyver em que havia umas formigas assassinas) entre outros...

Nunca agarrar o tronco de um marapião... Já me agarrei a várias eritrinas e não foi bonito. Imagino se me agarro a um destes: Fico lá pregado!

Ao fim do dia: arranjar lenha, montar tenda (pelo menos tentar) e agradecer aos deuses pela competência dos meus assistentes, caso contrário iria passar uma fome dos diabos. Obrigado Leonel e Adilécio pelos maravilhosos pitéus!!! Entrar para o meu Hammock (It’s a tent, it’s an Hammock, it’s a chair, it’s a supershelter, eu um dia mostro, mas isto dá um post à parte com direito a foto e tudo) antes que os mosquitos me desfaçam em papa e tentar sobreviver ao frio da noite (sim, é verdade tive frio durante a noite e bastante – da próxima levar saco-cama).

Depois de muitos dias de frustração sem conseguir fazer o trabalho que queria, voltar para casa e sarar as feridas.

Levar sempre muitas meias secas: Muito importante!!!! O botim dá muito jeito, mas tem os seus quês....

segunda-feira, 18 de maio de 2009

Agora pelo Norte!!!

Consegui finalmente acabar de marcar transectos na parte montanhosa da ilha e passei agora a parte Norte, que e a parte onde o Homem tem feito sentir mais a sua influencia. Supostamente quando S. Tome foi descoberta pelos portugueses estava coberta por floresta tropical, mesmo na zona Norte da ilha.
Hoje em dia no entanto esta parte da ilha ja tem muito pouca floresta. No extreme Norte e nas zonas mais junto ao mar existe um tipo de savana criada e mantida pelo Homem e na qual proliferam muitas species de fauna e flora introduzidas. Em seguida existem zonas de plantacao de sombra, na sua grande maioria para a producao de cacao. E a medida que o relevo fica mais acidentado aparecem algumas florestas, na sua grande maioria ja muito alteradas pelo Homem. Alias nesta nesta parte da ilha o meu garnde desafio vai ser mesmo encontrar manchas de floresta primaria (pouco alterada pelo Homem) em que possa fazer transectos!
Um aspecto da savana verdejante de Sao Tome

Zona de Fortunato, onde o relevo extremamente acidentado permite a subsistencia de algumas manchas da floresta original da parte Norte da ilha.

Mesmo nas zonas mais inacessiveis, a accao do Homem e evidente. E muito frequente encontrar carvoeiros, madeireiros, cacadores ou colectores de buzio a entrar pela floresta para encontrar a sua subsistencia!

Sao Tome possui bastantes especies de arvores endemicas, que se encontram ameacadas pelo aumento da procura de Madeira para construcao e para carvao.
Nas ferias os miudos saiem de fisga na mao a procura de um alimento extra. Estes por exemplo tinha apanhado 3 aves, todas elas endemicas: Selele, Tordo (quase ameacado) e Neto-de-olho-grosso (Vulneravel).

domingo, 10 de maio de 2009

Depois da tempestdae

E, voltando a estrada dos infernos para fazer mais 20km de zigue-zague depois de um dia de tempestade, eis o que encontrei:

Muita arvore caida


Muita lama no caminho, e mais arvores caidas...


Derrocada na berma do caminho (acho que a foto nao deixa perceber, mas ate la abaixo seriam uns bons 100m queda livre)

Mas como Sao Tome e mesmo uma terra abencoada, no fim da longa caminhada e de ter finalmente acabado o trabalho que me levava a percorrer este caminho dos infernos vezes sem conta, eis que encontro este animalzinho simpatico (ou melhor uma das pessoas que ia comigo, porque eu provavelmente nao o teria visto). Apesar do seu ar singelo e uma especie muito interessante. Trata-se de um musaranho endemico de Sao Tome em perigo critico de extincao, localmente conhecido por chininha!
Talvez nao seja assim tao dificil de encontrar, quando se fazem assim tantos quilometros na floresta, mas sao estas pequenas prendas que me vao dando forca para continuar o trabalho e fazendo acreditar que este e verdadeiramente um sitio especial para se trabalhar e, que apesar das dificuldades vale bem a pena insistir...

Aquilo que uma pessoa tem de ouvir....

“Brrranco”
“Doce”
“Amigo”
“Boooleia”
Estas serao por ventura as palavras mais ouvidas (e muito ouvidas) por qualquer branco que se aventure por terras santomenses. Ao fim de algum tempo a pessoa fica um bocado farta de ouvir, mas la se acaba por habituar. A nao ser e claro que o pedido de doce venha de alguem que ja tenha ha muito deixado de ser crianca, o que curiosamente nao acontece assim tao raramente.

E depois ha as verdadeiras perolas que saiem das mentes e das bocas deste povo:
“Vai fazer essa barba”
“O brrrranco e doido”
“Brrrranco feio”
“Da-me dinheiro”
Gritadas a alto e bom som, que e para que todos oucam e se saiba quem teve a coragem de fazer a gracinha! Mas, va la, ha que entrar no espirito e deixar a brincadeira continuar...

Ate que um dia, no meio de uma Estrada dos infernos, depois de um dia miseravel, com gripe e a apanhar chuva, depois de fazer uns 20kms a andar as curvas para nao adiantar trabalho nenhum, vem um tractor em sentido contrario e, em vez de parar na curva para me deixar passar, vem-se enfiar mesmo a minha frente, no meio da Estrada e para o tractor.
“O tractor nao tem bateria”

Por favor, alguem que me explique o que se passa na cabeca desta gente (alguma coisa???). Vem com um tractor carregado, para uma Estrada infinita onde geralmente nao passa ninguem e o tractor nao tem bacteria? E depois atravessa-se a bloquear a Estrada e ainda pede bacteria, sem ter fios nem nada para que a minha bacteria lhe pudesse ser util? Francamente. E como se isto nao fosse o cumulo, depois de me fazer perder mais uma hora a espera que viesse gente para empurrar o tractor, o que e que dizem no fim?
“Da-me dinheiro”

Nao ha paciencia...
Ah, e como nao poderia deixar de ser no dia seguinte fiquei sem bacteria no meio da capital e tive mesmo que pagar 150.000dobras pelo arranjo, gracas as mexidelas que andaram a fazer na bacteria no dia anterior!
Da vontade de bater em alguem....

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Arredores

Este domingo foi mais um dia dedicado a conhecer os arredores da Nova Moka.

Comecei por uma ronda para conhecer o quintal. Pode parecer um bocado ridiculo, mas so agora percebi verdadeiramente onde acaba o quintal. E que para alem de grande ate a semana passada estava coberto por um capim impenetravel. E descobri de que se andam a alimentar as ratazanas que costumam andar a correr no tecto. Bananas, obviamente. Anda uma pessoa a comprar bananas e afinal o quintal esta cheio de bananas. As centenas: banana-varla, banana-ana e banana-pao! Mas agora ja sei onde elas andam e como apanha-las, por isso vai deixar de ser preciso comprar bananas. Todos os sabados vai ser dia de apanhar banana!

Indo um pouco mais longe (Banana em Sao Tome e um tema muito longo, por isso e melhor abandona-lo ja! Um dia quem sabe dedique um post ao assunto: As bananas na republica das bananas), fui ate ao Rio aqui perto, para ver uma gruta de morcegos. E tendo em conta que se trata de uma ilha vulcanica estava bastante curioso para ver como teria surgido uma gruta (certamente nao haveria modelo carsico envolvido). Afinal era uma gruta escavada pelo proprio rio, fazendo uma ponte sobre o rio (Ponte-que-Deus-fez, como se diz por estas bandas). E ao sope da dita gruta havia uma bela cascata. Muito engracado, e apesar de nao ter conseguido fotografar os morcegos, havia-os por la. E muitos.



E arriscando-me a dar cabo da internet na ilha para o resto da eternidade aqui cometo a loucura completa de postar um video da gruta. E que as fotos nao ficaram la muito bem e acho que so mesmo com o video se percebe mais ou menos como era a gruta!




Para acabar o reconhecimento das redondezas, fui ate a Roca Saudade, que fica a uns 300m de casa. Sabia que o Almada Negreiros tinha nascido por la, mas como acontece sempre com as coisas que estao perto fui adiando a visita, ate este fim-de-semana. E eis a casa onde o dito senhor veio ao mundo:

Ao que parece ha uns anos tinha uma placa, mas agora nem sinais dela! Coisas do leve-leve...

Chover ou nao chover

E em Sao Tome e mesmo essa a questao! Tudo gira em torno da chuva e a chuva comanda o dia a dia.

E nao pensem que ha forma de contornar a questao. Se esta sol de manha e promessa de chuva. Se esta nevoeiro e porque vai chover. O vento tambem traz chuva. E depois ha passaros e grilos que chamam a chuva!

Chuva e para todos os gostos. Chuviscos ou pinga grossa, fria ou morna, menos no Norte da ilha e mais, muito mais no Sul, chuvada passageira ou dia(s) inteiro(s) a chover, nevoeiro humido ou desabamento aquoso. Enfim, chuva que nunca mais acaba....

A chuva fecha estradas, provoca derrocadas e cheias. A chuva nao vem e as colheitas nao dao... A chuva vem e ninguem sai de casa!

E quando o Sol vem, o melhor mesmo e aproveitar porque ele aqui nao manda nada e a chuva nao ha-de tardar!


E como ja nao tenho paciencia para a chuva, que me anda a afogar o trabalho, aqui fica uma foto do nascer do Sol, visto da Nova Moka!